sexta-feira

A cidade amarrada à cintura


rio de janeiro, de 14 de maio
 até 2 de agosto de 2013

I
os dedos nos olhos
apertá-los contra
os seixos do crânio

II
os cabos seguram
suas coxas hirsutas
o peito dos homens

mas a treva já
não se prende às telas
ocupara as ruas

as coxas
chefe das pernas
velas
para o amianto dos dias
revôltas
água sobre os calcanhares
e os cascos
sob palmos e terra

III
concreto ainda
o rubro fino dos ossos

placas contra os acrobatas
artilheiros nas marquises

aqui capinam o asfalto
vão montar campos de orquídeas
com húmus sobre os monturos
amarrá-las com arame

e as suas hastes flexíveis
são enganos à dureza
da coluna que em camadas
se nomeia diapasão
subterrâneo em nossas casas

IV
o inverno seria sempre o mesmo
não fosse o amassar as solas
ao atravessar a passarela
e chegar
ao parque
que farei hoje com mais pesar
levando a cidade demolida
para dentro do museu

à moenda de cidades
que são as maquetes da utopia
à palavra pólvora
vermelha sobre a madeira
e nenhuma janela translúcida
que me permita o aterro
ou aberta
convide o cigarro

as varandas interditas
e a cidade amarrada à cintura
não é possível despejá-la

cidade
colar de cartilagens
cidade
macacos do vício de burroughs
e elefantíase do litoral

5 comentários:

Matheus José Mineiro disse...

as coxas
chefe das pernas--anatomico ,foda.....fico impressionado com questao da armonia que reparo tt no sopro sopro,qt o que leio no blog,a tempo,é a fusao- verso curto + e o som-fonema de cada substantivo - poucos adjetivos-nomes, da um resultado legal pro ouvido e na elucidaçao .ta massa ler ta original,soa.bem.

Victor Meira disse...

Legal que estão numeradas, acho que preciso isolar cada uma pra curtir melhor.

Por hora, adoro isso:

"a treva já
não se prende às telas
ocupara as ruas"

Victor Meira disse...

Aliás, esse "treva já" é uma brincadeira com "diretas já"? Porque se não for, o natural desse "já" é estar no verso de baixo, né?

Victor Meira disse...

Terceiro dia de leituras, e não consigo girar a tampa dessa compota.

Victor Meira disse...

O que fica é a relação entre o corpo e a cidade, a cidade organismo. Parece ter algo sobre os eventos políticos recentes, manifestações, etc, mas ao mesmo tempo parece ser fotografia cotidiana do Rio, sem conexão com as manifestações ou qualquer cenário político.

Que superfície dura.

crédito do desenho no cabeçalho: dos meses duro, nanquim sobre papel, 2010 Philippe Bacana