segunda-feira

Jorge Carrera Andrade - Um visitante chamado Nevoeiro

Caixão do tempo:
deixei pra você meu cadáver de vinte aniversários
sob terra de flores e amuletos
e cascas de dias devorados.

Amuleto de amor foi a maçã
amuletos de luz, a chave, seu barco
a gaivota e o peixe, doadores
de uma vida sem nuvens, num vagão de asas.

Vesti meu cadáver de estações
e sobre a viola do passado
reclinei sua cabeça vendada de cidades
acesas como colos.

Deitei com ele nomes de outras épocas,
os rostos mascarados já de sombras
e deixei ele viver a morte eterna
seu tempo era chuva, milho e cavalos

A terra inesquecível cede agora:
Meu menino, você não tá bem sepultado?
É sua essa mão que se move
buscando na ruína esqueletos de pássaros?

Visitante de neblina
vindo de um país de calendários e retratos:
Senta à minha mesa médica e camponesa,
vestido um pouquinho com meu terno de poente

Fantasma familiar, me vem à tona
chamado por uma marca, cheiro ou gesto.
Só um cavalo e uma rosa guardam
seu caixão de anos.





Jorge Carrera Andrade – Quito, Equador, 1903-1978
El visitante de niebla

Sepultura del tiempo:
dejé en ti mi cadáver de veinte años
bajo tierra de flores y amuletos
y cáscaras de días devorados.

Amuleto de amor fue la manzana,
amuletos la luz, la llave, él barco,
la gaviota y el pez, dispensadores
de una vida sin nubes, viaje mágico.

Le vestí a mi cadáver de estaciones
y sobre la guitarra del pasado
recliné su cabeza vendada de ciudades
lucientes como bálsamos.

Puse a su lado nombres de otras épocas,
los rostros ya de sombra enmascarados
y le dejé vivir su larga muerte
en un clima de lluvia, de maíz y caballos.

La tierra memorable cede ahora.
Joven mío, ¿no estás bien sepultado?
¿Tu mano es esta mano que se mueve
buscando entre las ruinas esqueletos de pájaros?

Visitante de niebla
venido de un país de fechas y retratos:
Te sientas a mi mesa nodriza y hortelana,
vestido unos instantes con mi traje de ocaso.

Fantasma familiar, compareces al punto
por un signo, una voz o una forma llamado.
Sólo un caballo y una rosa guardan
tu sepultura de años.

Nenhum comentário:

crédito do desenho no cabeçalho: dos meses duro, nanquim sobre papel, 2010 Philippe Bacana